quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

RECORDAR É VIVER

Hoje meu pensamento se volta para meu saudoso Pai (+ 21-03-1994). Abro a Imitação de Cristo, o célebre livro de Tomás de Kempis (Alemanha, 1380 – 1471), obra que através de tantos séculos tem derramado por toda parte inefáveis consolações, como leio no prefácio desta edição que Papai me ofereceu, por ocasião da despedida de minhas últimas férias, antes de entrar no Noviciado Franciscano.
Ele adquiriu em Maceió um exemplar da última edição das VOZES DE PETRÓPOLIS para presentear-me. Que delicadeza de Papai! Ele tinha gestos assim na hora certa.
Vejam a riqueza do oferecimento, escrito na hora da despedia, me lembro bem:
Ao nosso querido Miltinho, com os corações traspassados de saudades, uma lembrança das últimas férias que passaste ao nosso lado. que Deus recompense o sacrfício da dura separação, fazendo de ti um santo sacerdote franciscano. Neste livro tão pequeno, encontrarás lenitivo nas horas de sofrimentos. Receba com nossas bênçãos os corações saudosos de teus pais
Heriberto e Inês.
Fernão Velho, 5-2-1955.

Na página em branco, ao lado, escrevi:
Entrada no noviciado: 14-08-55
1ª Profissão: 15-o8-56
Profissão solene: 15-08-59
Presbiterato: 22-07-61
Bodas de Prata de religioso: 15-07-80
Bodas de prata sacerdotais: 22-07-86
Bodas de Prata de casamento de meus pais: 20-12-58
Bodas de Ouro de casamento de meus pais: 20-12-83
+ Papai: 21-03-94
+ Mamãe: 31-12-99
Poderia ter acrescentado:
Bodas de Diamante de casamento de meus pais: 20-12-1993. Celebrei em Bezerros, mas sem festa, pois papai se achava muito doente.
UMA PERDA IRREPARÁVEL - Nunca cesso de lamentar ter perdido o precioso devocionário que Papai me ofereceu (juntamente com Mamãe) no dia de minha partido para o Colégio Seráfico de Ipuarana, 27 de janeiro de 1946. Eu havia completado 11 anos em outubro! Aquela despedida foi a mais dura de minha vida e sei também que da vida deles. A dedicatória de Papai refletia essa dor, mas, ao mesmo tampo, a esperança de ver um dia o filho frade franciscano e sacerdote. Que livrinho precioso aquele que Papai guardava para aquela hora! Era uma edição portuguesa (do Porto), de uma delicadeza extraordinária: um livrinho que só podia ter sido editado para presente: em encadernação luxuosa, cujas capas se fechavam como que guardando um segredo. Em papel finíssimo, em arte primorosa. Tudo leva a crer que fora adquirido numa dessas passagens por Bezerros de um agente da Boa Imprensa de Portugal. Foi nesse livrinho que eu trazia aos domingos no bolso do palitó e todos os dia levava para a missa, que, pela primeira vez, descobri o drama da Paixão de Cristo no Salmo 21 (“Meus Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” ). Lia-o muitas e muitas vezes com os olhos rasos dágua. Foi, através desse livrinho, o meu primeiro contacto com a Bíblia. Foi através dele também que descobri a riqueza da Missa, a beleza da devoção a Nossa Senhora e aos Santos, coisa que eu já sabia e o devocionário me ajudou a compreender melhor. Até que um dia... Após a oração da noite no sábado, eu o deixei no banco, no lugar que eu ocupava, não sabendo que, no domingo de madrugada a igreja ficava cheia com o povo da Paróquia de Lagoa Seca. Quando nos dirigimos à igreja para a missa dos alunos, às 06:00 h, e que procurei meu devocionário... o canto mais limpo! Em 1962, já sacerdote, fui transferido para o Seminário de Ipuarana. Em contacto permanente com os paroquianos na sede e nas capelas, nunca deixei de indagar pelo livrinho de estimação. Quem sabe se não teria ido parar em alguma família que freqüentava a igreja do Convento? No próprio Convento eu busquei em todos os lugares onde ele poderia estar, sem resultado, desde a sacristia até a biblioteca, pois me informaram que talvez o sacristão tivesse recolhido antes da missa com o povo o que pertencia aos alunos.
Só me resta agora buscar, nos Sebos de Portugal, pela internet, o que hoje não deixaria de ser uma raridade bibliogáfica. Mas esqueci o nome do devocionário, o que dificulta a pesquisa mas não a torna impossível. Algumas característica do livrinho são inconfundíveis: por exemplo, a sua riqueza bíblica. O Salmo 21. Mas a internet jamais me devolverá a a dedicatória de Papai!!!

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